Estela M Oliveira
Sou o lavrador, a semente e o adubo, sou a flor e o fruto da Cidade Sinfonia!
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Textos
As curvas do Pirajibu

           Ao contemplar algumas fotos antigas, renasce em mim uma menina de seis anos. Do alto da Rua de Cima, contemplo o Sol aos poucos se  escondendo no Morro de Bofete. Os raios vão amarelando no horizonte, iniciando mais uma noite sobre as pastagens e sobre a cidade de Porangaba. Parece ser um momento triste, mas na verdade é hora de escutar o sino tocar suas badaladas e a Ave Maria das dezoito horas. As famílias se recolhem para o jantar, depois saem para as conversas nas calçadas enquanto a criançada brinca na rua.
             Nas curvas da estradinha do Pirajibu, vão desfilando personagens reais que construíram a história desta cidade. Os Amarais, a Valenciada, os Bechelis, os Silvas, os Gonsalves, os Mirandas, os Valários, os Mirandas,  os Marques e tantos outros que vêm  dos bairros mais distantes  pisoteando o barro e engolindo  a poeira do caminho.
             Por estas curvas chegam as batatas do seu Dico, as carroças com leite para o lacticínio. Sacudidas, as mocinhas, aos pares, sobem as curvas com os sapatos e chinelos nas mãos para calçar na entrada da cidade.  De manhã e de tardezinha Alcina vai e vem levando pão e trazendo as colheitas diárias da chácara, da horta, do pomar e os ovos caipiras.
            Enxergo minha tia Iolanda, tratando das galinhas na chácara ali embaixo. Ainda sinto o seu olhar sereno, aqueles olhos azuis sorrindo para a vida. Minha prima desce correndo o trilho feito na grama pela passagem diária. Vou junto nessa corrida para pedir a benção e tomar o leite fervido, descansado no rabo do fogão. Lembro da sua preocupação com o crescimento do rio e a possibilidade de enchente.
              Enchentes  que são frequentes na época da chuva, cujas águas invadem as casinhas dos moradores da baixada. O sufoco para acudir as tralhas de casa é grande e ainda, ter  que procurar uma casa de uma  comadre para passar a noite. Vejo o corre-corre do Pedrinho Martim para acudir seu cavalo. Lá no alto, o povo da cidade assiste o distender das águas.
              Ainda escuto os gritos de minha tia, tentando acudir o Tiquinho Carreté que está sendo levado pelas águas crescidas do Rio Feio. Ele desaparece e não volta vivo mais.
             A noite desce. O tempo passa. A majestosa árvore foi tombada e  a descidão deu lugar a um belo prédio. As casinhas são maiores agora. O asfalto cobriu a terra. Mas o morro de Bofete continua a receber e a guardar o Sol toda  tardezinha.
            Fico com a Ave Maria, com os raios solares no poente e com o coração cheio de boas lembranças de uma infância e adolescência sadia na minha terra.
Estela Maria de Oliveira
Enviado por Estela Maria de Oliveira em 25/10/2023
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